”Quando você lé esta carta, eu já estarei longe. Estou escrevendo na nossa sala, que tantas vezes serviu de palco para o nosso amor. Não vou mentir, isto está custando mais do que eu esperava. As minhas coisas já estão na mala, com ela levo tudo aquilo que vivemos de bom e infelizmente todos os sonhos, que não passaram disso. Por favor, não me culpes pela covardia de não esperar você chegar para eu ir embora, tenho medo que caso estivesse aqui me faltaria coragem para bater a porta.
Tomei esta decisão porque não aguentava mais a rotina em que a nossa relação se transformou. Luto há imenso tempo por uma melhora, mas tem sido tudo em vão. Estou cansada de viver com uma pessoa que se tornou praticamente um estranho. Há meses que acordo e adormeço me perguntando onde eu errei. Que mal tão grande te fiz, para que além de não me amar, não me deixa te amar. Choro todos os dias no banho, para que não me ouças, embora saiba que não se importa que eu chore ou que eu sorria. Já tentei conversa com você, sempre a resposta de que está tudo bem.
Fomos um casal apaixonado, onde a nossa cumplicidade era tanta, que um só olhar bastava. Horas e horas entre os lençóis, a sorrir, a brincar, a descansar em silêncio nos braços um do outro, a planear um futuro… e que futuro este hein… onde todas as promessas foram apenas isso mesmo, onde os sonhos não passaram do imaginário. Onde antigamente sabia repousar, estar em silêncio para ouvir o teu coração, agora me acostumei. O nosso silêncio já não é de paz e tranquilidade. Agora é de quem nada tem para dizer.
Tenho tanta pena não me deixar te amar. Porque eu ainda te amo, e ainda tento, embora que em vão, te da mão na rua, te convidar para sair, tentar timidamente te seduzir. Não imagina o que custou as vezes que estava cozinhando, pra você engolir a comida às pressas e virar as costas, sem dizer uma palavra, sem o mínimo de respeito de me deixar pela milésima vez jantando sozinha.
Não imagina como me sinto destroçada. Todas as manhãs ouço a porta bater quando sais, sem um bom dia, um até logo. Quando volta a mesma coisa, entras em casa, e simplesmente é como se eu ali não estivesse.
Confesso que já te segui, já vi todos os teus e-mails, o tu celular, revirei todas as suas roupas. Nada. Não encontro provas de outra mulher em sua vida. A única prova que encontro é que você não me ama, mas que provavelmente não me deixa pelo comodismo. E embora eu te ame, não posso estar com alguém que nem me olha nos olhos
Sempre imaginei você à minha espera no altar, que me levasse ansioso de felicidade à maternidade. Sempre me prometeu isso. Agora ris na minha cara, dizes que sou ‘tolinha’, que não tem tempo pra essas coisas. ‘Essas coisas’ sou eu. São planos que um dia tínhamos feito. São os sonhos de menina que prometeu realizar. Em todas as discussões que temos, em que me grita e me humilha, não olha para trás. Não pede desculpa. Não vê o estado lastimável em que me deixa.
Cansei de te ouvir gritar, e de quando gritava mais, só o seu silêncio por esquecer que eu existo. Cansei de mendigar amor e atenção.
Então hoje, triste e sozinha como tem sido ultimamente, me olhei no espelho e decidi que queria voltar a sorrir. Tomei um banho, meio de água doce, meio de água salgada devido ao tamanho do meu choro. Vesti a minha melhor roupa, cobri estes lábios tristes de um lindo batom vermelho e arrumei as minhas coisas. Garanti que para além desta carta, e do resto do meu perfume no ar, nada iria acusar a minha existência nesta casa. Te Amei mais que tudo, mais que a mim mesma. Vivi para você, para te amar, e fui tão feliz. Até ao dia em que você deu o certo pelo incerto e esqueceu que sou como uma planta, que precisa de ser regada.
Pois bem, passados cinco anos de relação, onde um foi passado a ignorar o outro, eu tentei que me visse, hoje decidi olhar para mim mesma.
Quando sair por aquela porta, sei que uma faca me vai trespassar o peito, que vou sentir as pernas faltar, que o ar vai me rebentar os pulmões, que as lágrimas vão me cortar o rosto. Sei que vou chorar noites e noites, que vou deixar de comer. Provavelmente irei acordar a meio da noite assustada, e te procurar na cama. Vou olhar varais vezes para o celular, só para ter a esperança de que em algum momento lembrou de mim. Irei ver e rever as nossas fotos, cheirar todas as minhas roupas na esperança de encontrar o teu cheiro. Vou chorar até faltar o ar, e me contorcer de dor, pois imagino que o meu coração doa tanto que eu vou desejar morrer.
Mas depois tudo vai passar. E vou finalmente sorrir por não ter de mendigar o seu amor. Vou renascer aos poucos, muito ferida e queimada de dor, mas vou conseguir andar sozinha outra vez. No momento uma parte de mim me diz que vou te amar para sempre. E acho que vou amar. Mas agora vou amar a mim primeiro. Da próxima vez que eu vir você meu coração vai doer um pouquinho, mas aí vou me lembrar de tudo que já fiz para estar a teu lado, e foi você que não me quis por perto. Tenho a esperança de um dia encontrar alguém que queira passear de mãos dadas comigo, que me dê um beijo de bom dia, que me diga que sou linda, que me faça companhia ao jantar, que me espere no altar. E um dia você vai desejar ser esse homem, que um dia já foi, mas que não voltará a ser.
Com carinho da tua agora ex-namorada.”
